RESTAURANTE-ESCOLA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS - UFPEL
BLUME, Simone Isabel1; RIBEIRO, Gladis Aver1.
1Laboratório de Bacteriologia – DEMP – IB/UFPel
Campus Universitário – Caixa Postal 354 – CEP 96010-900
simone.biologia@yahoo.com.br
1. INTRODUÇÃO
A partir do momento que o homem começou a elaborar seu próprio alimento, além
das preocupações com o sabor dos mesmos, também se preocupou com as doenças
veiculadas por alimentos. Doença Veiculada por Alimento (DVA) ou Doença Transmitida
por Alimento (DTA) são termos utilizados para designar a doença causada pela
ingestão de microrganismos viáveis (infecção) ou toxinas por eles produzidas
(intoxicação) em quantidades suficientes para o desenvolvimento de quadro patológico,
tendo como agente vetor e principal porta de entrada a via oral (Souza et al., 2004).
As toxinfecções alimentares constituem um problema sério de Saúde Pública no
Brasil, sendo que as empresas de refeições coletivas representam a maior fonte de
surtos de doenças de origem alimentar. Contribuem para estes surtos os ambientes, os
manipuladores de alimentos, equipamentos e utensílios (Chesca et al., 2003).
Equipamentos e utensílios com higienização deficiente têm sido causadores de
surtos de doenças de origem microbiana ou de alterações de alimentos processados.
Há relatos de que utensílios e equipamentos contaminados participam do aparecimento
de aproximadamente 16% dos surtos (Chesca et al., 2003).
A alta rotatividade das tarefas em restaurantes pode trazer prejuízo para a
higienização de utensílios, permitindo que contaminantes perigosos sobrevivam e
representem uma ameaça à saúde das pessoas, principalmente as imunologicamente
desprotegidas. A limpeza de talheres e pratos reduz a carga microbiana das superfícies,
mas não a índices satisfatórios e, por isto, o processo de desinfecção é indispensável.
Apesar de não se saber exatamente qual é o envolvimento de um utensílio, no que se
refere à contaminação alimentar, o risco é sempre menor quando são usados utensílios
limpos e desinfetados (Leles et al., 2005).
A higienização inadequada dos utensílios pode ser verificada através da análise
de microrganismos indicadores de contaminação fecal ou da qualidade higiênicosanitária
dos mesmos.
As bactérias pertencentes ao grupo dos coliformes termotolerantes são aquelas
que apresentam capacidade de fermentar lactose com produção de gás em 48 horas a
44,5ºC, tendo como principal agente bacteriano a Escherichia coli, que é indicadora de
contaminação de origem fecal, uma vez que esse microrganismo é encontrado no trato
intestinal de animais de sangue quente (Franco & Landgraf, 1996).
A grande maioria das bactérias patogênicas de origem alimentar são mesófilas.
Portanto, uma alta contagem de bactérias mesófilas aeróbias significa ocorrência de
condições favoráveis à multiplicação dos mesmos (Souza et al., 2004). Não há padrões
microbiológicos estabelecidos para mesófilas aeróbias, porém esta contagem é
comumente empregada para indicar algum procedimento inadequado sob o ponto de
vista sanitário (Franco & Landgraf, 1996).
Diante do exposto, objetivou-se avaliar a qualidade sanitária de talheres e pratos
utilizados no Restaurante-Escola da UFPel, prontos para serem utilizados, através da
análise de coliformes termotolerantes e bactérias mesófilas aeróbias, permitindo
orientar condutas que resultem em uma melhor segurança alimentar.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Entre junho e agosto de 2006, talheres e pratos utilizados no Restaurante-Escola
da UFPel foram submetidos à avaliação de suas condições de higienização, num total
de trinta amostras, sendo a execução das análises realizadas no Laboratório de
Bacteriologia do Departamento de Microbiologia e Parasitologia do Instituto de Biologia
da Universidade Federal de Pelotas.
A coleta das amostras foi realizada através da técnica de esfregaço em superfície,
utilizando-se swabs estéreis embebidos em 9mL de água peptonada 0,1%. Após, os
tubos foram identificados e imediatamente levados ao Laboratório, onde foram
incubados a 37ºC/24h. Em seguida, retiraram-se os swabs dos tubos e a partir desta
suspensão, considerada a diluição 10-1, realizaram-se as diluições decimais seriadas,
em água peptonada 0,1% estéril.
Para cada grupo de microrganismos avaliados, foi seguida uma metodologia
adequada (Silva et al., 1997). Na análise de coliformes termotolerantes foi utilizada a
técnica dos tubos múltiplos, utilizando Caldo Lactosado (CL) com tubo de fermentação
invertido (tubo de Durhan) como teste presuntivo. Dos tubos presuntivamente positivos
para coliformes, ou seja, onde houve crescimento com produção de gás, realizou-se
teste para confirmação de coliformes termotolerantes, em tubos contendo caldo EC e
tubos de Durhan. A partir dos tubos com crescimento e produção de gás obteve-se o
Número Mais Provável (NMP), através da observação da combinação de tubos
positivos e quantificação através da tabela de Hoskins.
A quantificação das bactérias mesófilas aeróbias foi realizada através da técnica
de plaqueamento em superfície em Ágar Padrão para Contagem (APC). Foi inoculado
0,1mL de cada diluição na superfície do meio usando uma alça de Drigalsky, sendo o
inóculo distribuído por toda a superfície até que todo o excesso de líquido fosse
absorvido. Foram semeadas duas placas para cada diluição e, depois de incubadas a
37ºC/24-48h, foi feita a média do número de colônias de ambas placas, em cuja diluição
apresentasse entre 25 e 250 colônias. Os resultados foram expressos em Unidades
Formadoras de Colônias (UFC) presentes na superfície total do utensílio.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados das análises microbiológicas realizadas estão apresentados na
Tabela 1.
Embora seja de consenso universal que os utensílios empregados no preparo,
acondicionamento, transporte ou mesmo durante as refeições, sejam veículos
potenciais para a disseminação de microrganismos deteriorantes e patogênicos, os
pesquisadores nunca deram, a essas fontes, a mesma atenção dedicada aos alimentos.
A literatura mundial carece de informações que possam nortear condutas e estimular a
criação de legislação regulamentadora específica para introduzir um instrumento legal
de controle que assegure a qualidade dos serviços de alimentação coletiva e a saúde
da população usuária (Leles et al., 2005).
Tabela 1. Contagem microbiana em utensílios utilizados no Restaurante-Escola da UFPel.
DATA PRATO GARFO FACA
DA COLETA Mesófilas
(UFC)*
Coliformes
(NMP)**
Mesófilas
(UFC)
Coliformes
(NMP)
Mesófilas
(UFC)
Coliformes
(NMP)
26/06/06 3,6x103 <3 <25 <3 <25 <3
03/07/06 <25 <3 <25 <3 <25 <3
10/07/06 1,73x107 <3 <25 <3 <25 <3
18/07/06 2,06x108 <3 1,65x108 <3 2,29x108 <3
24/07/06 2,4x106 <3 2,41x106 <3 2,48x106 <3
31/07/06 2,21x107 <3 2,7x105 <3 1,74x107 <3
08/08/06 4,1x107 <3 <25 <3 9,7x107 <3
14/08/06 2,37x107 <3 <25 <3 2,09x108 <3
21/08/06 9,6x107 <3 5,4x106 <3 8,8x107 <3
31/08/06 5,1x105 <3 <25 <3 7,9x107 <3
Padrão
estabelecido 102 ausência 102 ausência 102 ausência
*UFC/st: Unidade Formadora de Colônia.
**NMP/st: Número Mais Provável.
A inexistência de referência que pudesse caracterizar a importância dos níveis de
contaminação microbiana encontrada nos utensílios examinados neste trabalho, com os
riscos à saúde das pessoas, levou-nos a adotar o valor 102 UFC/superfície total como
sendo representativo de uma alta contaminação por bactérias mesófilas, visto que a
resolução RDC número 12 de dois de janeiro de 2001 (Anvisa, 2006), estabelece este
limite de tolerância para a contaminação microbiana em diversos tipos de alimentos, e,
pelo mesmo critério, adotou-se para coliformes termotolerantes, ausência destes no
utensílio. Empregou-se, portanto, o critério que os utensílios devam ser tratados como
parte integrante da alimentação.
Na análise de coliformes termotolerantes, 100% das amostras analisadas
apresentaram resultado inferior ao limite de detecção da técnica, portanto, dentro dos
padrões. Leles et al. (2005), analisando a higienização de talheres, porém visando
estabelecer o número de microrganismos por centímetro quadrado, encontraram
apenas 3,85% das amostras contaminadas com coliformes termotolerantes.
Na pesquisa quantitativa de bactérias mesófilas aeróbias pode-se notar um grande
índice de contaminação. Os pratos apresentaram contaminação acima do padrão
estabelecido em 90% das amostras, enquanto que garfos e facas apresentaram 60% e
30% das amostras contaminadas, respectivamente. Este maior índice de contaminação
dos pratos provavelmente deve-se a maior área de superfície, comparando aos outros
utensílios analisados. Leles et al. (2005) também encontraram considerável
contaminação de mesófilas aeróbias em talheres, onde 61,5% das amostras estavam
acima do padrão estabelecido.
Considerando-se que os microrganismos pesquisados podem ser removidos ou
inativados pelos processos convencionais de limpeza envolvendo detergente e água
fervente, os resultados podem revelar que a higienização dos utensílios tenha sido
deficiente. Porém, os altos índices de contaminação por bactérias mesófilas associado
à ausência de coliformes termotolerantes, pode ser explicada pelo fato de que, estes
utensílios, após higienização, permanecem expostos até o dia seguinte, quando então
serão novamente utilizados.
4. CONCLUSÕES
Com base nos dados observados, pode-se concluir e sugerir que há necessidade
de uma reavaliação dos métodos de higienização dos utensílios analisados através da
conscientização dos manipuladores, além de um acondicionamento adequado do
material já higienizado, garantindo assim a qualidade das refeições coletivas.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Disponível em:
Equipamentos e utensílios de unidades de alimentação e nutrição: um risco
constante de contaminação das refeições. Revista Higiene Alimentar, v. 17, n.
114/115, p. 20-23, novembro/dezembro de 2003.
FRANCO, B. D. G. de M.; LANDGRAF, M. Microbiologia dos Alimentos. Editora
Atheneu: São Paulo, 1996. 182p.
LELES, P. A.; PINTO, P. S. A.; TÓRTORA, J. C. O. Talheres de restaurantes selfservice:
contaminação microbiana. Revista Higiene Alimentar, v. 19, n. 131, p. 72-76,
maio de 2005.
SILVA, N. da; JUNQUEIRA, V. C. A.; SILVEIRA, N. F. A. Manual de Métodos de
Análise Microbiológica de Alimentos. Livraria Varela: São Paulo, 1997. 295p.
SOUZA, E. L.; SILVA, C. A.; SOUSA, C. P. Qualidade sanitária de equipamentos,
superfícies, água e mãos de manipuladores de alguns estabelecimentos que
comercializam alimentos na cidade de João Pessoas, PB. Revista Higiene
Alimentar, v. 18, n. 116/117, p. 98-102, janeiro/fevereiro de 2004.
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